HÁ 22 ANOS FALECEU UM FUTEBOLISTA DE EXCELÊNCIA.
O melhor defesa-direito dos anos 20 e um dos
melhores de sempre do futebol português.
António Pinho nasceu em Santiago de Riba-Ul, uma aldeia no concelho de Oliveira de Azeméis, em 25 de Fevereiro de 1899. Órfão de pai, ingressou na Real Casa Pia de Lisboa com nove anos, com o n.º 3732, em 30 de Setembro de 1908.
Estreia na equipa escolar da Casa Pia de Lisboa
Em 1912/13 estreou-se com
13 anos num campeonato interno entre alunos. Aos 15 anos, em 1913/14 já
representava esta nobre instituição no Campeonato Escolar da AFL. Aos 17 anos
conquistou o “Prémio Dr. Januário Barreto”, destinado ao melhor
“jogador-escolar” da AFL, instituído em homenagem ao insigne médico casapiano,
falecido muito novo aos 33 anos, em 1909. Januário Barreto foi também o
primeiro presidente da Direcção do “Glorioso”, entre 1906 e 1908; e o primeiro
presidente da LPF em 1908/09, organismo que daria origem à AFL.
Um dos melhores futebolistas casapianos da sua geração
António Pinho
em 1916/17 subiu à 1.ª categoria escolar, mantendo-se na equipa principal até
final da temporada de 1917/18. Após cinco temporadas a jogar pelas equipas da
escola, aos 19 anos ingressou no Benfica no início da época de 1918/19. Seguia
o percurso habitual dos futebolistas casapianos desde a fundação do nosso
Clube, em 28 de Fevereiro de 1904. Entretanto ao terminar os estudos empregou-se
na Secretaria da Casa Pia de Lisboa.
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Equipa titular do jogo, em Madrid, a 7 de Outubro de 1919. De cima para baixo. Da esquerda para a direita: Cândido de Oliveira, ANTÓNIO PINHO, Clemente Guerra, Fernando de Jesus e José Maria Bastos; António Brás, Herculano Santos, José Pimenta, Artur Augusto e Jesus Muñoz Crespo. Ao centro, o capitão Vítor Gonçalves |
Chegar ao topo em meia época
E no
Benfica foi “obrigado” a fazer o percurso habitual a todos os que se iniciavam
no futebol do “Glorioso”, pois Cosme Damião queria não só bons jogadores, mas
jogadores benfiquistas experientes e campeões. Começou na 4.ª categoria, mas
devido à sua qualidade depressa chegou à primeira. Estreou-se como
defesa-direito em na 4.ª categoria, em 5 de Janeiro de 1919 num jogo com o
Grupo Futebol Benfica para o Regional de Lisboa, onde fez nove jogos; na 3.ª
categoria fez quatro jogos; na 2.ª categoria fez três jogos; e finalmente
estreou-se na 1.ª categoria em 6 de Abril de 1919, num encontro com o Sporting
CP para o Regional de Lisboa disputado no nosso campo de Benfica. Conquistou a
titularidade até final desta primeira temporada. Uma progressão notável –
passar em 13 jogos, num prazo de três meses, da 4.ª à 1.ª categoria, só estava
(para Cosme Damião) ao alcance de jogadores muito valorosos. Entretanto a
estreia na equipa principal ocorrera em 5 de Dezembro de 1918, mas num encontro
particular, com os “sempre difíceis ingleses” de um barco britânico que
atracara no rio Tejo – o cruzador “Active”, e que o Benfica venceu por 1-0, no
campo de Palhavã, palco dos jogos internacionais em Lisboa. A sua utilização
deveu-se ao facto da “necessidade de reforçar” a equipa principal num encontro
internacional.
Aos 20 anos e sete meses de idade
Aos 29 anos e nove meses de idade
Esplêndido lutador
Actuou
sempre – em toda a sua carreira de 17 épocas de futebolista – como
defesa-direito! Foi um atleta resistente e fogoso, dotado de um pontapé forte e
certeiro, numa alma esplêndida de lutador. Um grande jogador – enérgico, seguro
e valente – e um desportista exemplar – correcto, aprumado e valoroso. Tinha as
características de grande defesa, pois “nunca virava a cara à luta”. Mesmo
quando defrontava um avançado adversário mais forte e tecnicista, lutava sempre
com lealdade, nem que fosse até à exaustão. Nunca se dava por vencido. Sabia
que com modéstia o futebol permite que os defesas brilhem frente aos avançados.
António Pinho era um indomável, com uma coragem verdadeiramente excepcional!
Conseguia ser muito forte, sem recorrer à violência. Por isso foi o melhor
defesa português (internacional de 1921 a 1928) durante dez temporadas, entre
1919 e 1928. Indomável, na temporada de 1919/20 efectuou 21 jogos consecutivos
pelo “Glorioso” num total de 1890 minutos. Em sete meses, entre 20 de Setembro
de 1919 e 25 de Abril de 1920, jogou todos os encontros do Clube.
Sair para voltar
Jogou no
Benfica, ao mais alto nível, durante duas épocas em 1918/19 e 1919/20, sempre
como titular a defesa-direito. Na primeira temporada aproveitando a “baixa de
forma” do habitual titular, o popular Bastinhos e na segunda época “desviando”
este futebolista para defesa-esquerdo. Fizeram uma dupla fantástica! No final
desta temporada de 1919/20 quando surgiu a possibilidade da sua Casa Pia formar
um clube desportivo, foi um dos mais entusiastas, contribuindo para a fundação
em 3 de Julho de 1920 do Casa Pia AC. O Benfica sofria a saída de onze futebolistas
(de várias categorias) com grande valia e estancava-se uma das “fontes” de
recrutamento de jovens futebolistas, a Casa Pia de Lisboa. Foi um “rombo” que
levou alguns anos a “sarar”, até porque no ano anterior “secara a outra fonte”,
os jovens do bairro de Belém, com a formação do CF “Os Belenenses”, em 23 de
Setembro de 1919. Em apenas duas épocas (1919 e 1920) o Benfica debatia-se com
o facto de terminar o hábito que datava desde a nossa fundação, de se reforçar
e renovar prioritariamente (porque eram as duas melhores “escolas”) com
futebolistas de Belém e da Casa Pia! Mudavam-se os tempos! Após oito
temporadas, entre 1920/21 e 1927/28 como defesa do Casa Pia AC decidiu
regressar ao “Glorioso” no início de 1928/29. Jogou pela última vez com a
“camisola vermelha da águia” em 1 de Junho de 1930 na final do Campeonato de
Portugal, em que vencemos por 3-1 o FC Barreirense, no campo 28 de Maio, cujo
proprietário era o Sporting CP. Aos 31 anos, despedia-se com um título, o mais
importante na sua longa carreira de futebolista.
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Plantel que conquistou a Taça Preparação da AFL, no estádio do «Glorioso» nas Amoreiras, em 29 de Setembro de 1929. De cima para baixo. Da esquerda para a direita: Pedro Silva, Luís Costa, Ralf Bailão, Fernando Adrião, ANTÓNIO PINHO, Artur Dyson, Aníbal José e Vítor Hugo (capitão); Mário de Carvalho, João de Oliveira, Vítor Silva, Guedes Gonçalves e Eugénio Salvador |
Muita qualidade
Jogou
quatro temporadas no “Glorioso” sempre a titular, entre 1918/19 e 1919/20 e
entre 1928/29 e 1929/30, sempre como defesa-direito num total de 8010 minutos
(133 horas ou cinco dias) em 89 jogos, com 88 completos. Capitaneou
o Benfica, num jogo, em 6 de Junho de 1929, com empate a um golo com o CS
Marítimo. Em 31 de Julho de 1938, aos 39 anos foi agraciado pelo Benfica como
“Sócio de Mérito”.
Internacional português
Foi um
dos onze portugueses que integraram a primeira selecção nacional, organizada em
18 de Dezembro de 1921, num particular realizado em Madrid com derrota por 1-3
com a Espanha. Já jogava no Casa Pia AC, clube que cedeu o maior número de
futebolistas – quatro, dos quais três haviam pertencido ao Benfica: António Pinho,
Cândido de Oliveira (capitão) e José Maria Gralha. O Benfica estava
representado por três futebolistas: Vítor Gonçalves, António Ribeiro dos Reis,
ambos casapianos e Alberto Augusto, marcador do golo da selecção. O único
jogador do FC Porto, Artur Augusto também se iniciara como futebolista no
Benfica. Ou seja, sete jogadores em onze tinham ligação ao “Glorioso”. António
Pinho e Alberto Augusto foram os únicos que jogaram os três primeiros encontros
da selecção, em 1921, 1922 e 1923, ou seja, ao 3.º jogo eram os mais
internacionais. António Pinho não participou no 4.º jogo, mas esteve depois nos
sete jogos seguintes, até ao 11.º, em 1927. Com dez participações era o mais
internacional.
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A 5.ª selecção nacional, a da primeira vitória (1-0 com a selecção italiana, em 18 de Junho de 1925, no estádio do Lumiar): Raul Figueiredo, Delfim, Mário de Carvalho, ANTÓNIO PINHO, César de Matos, Augusto Silva, Domingos Neves, Manuel da Fonseca, Francisco Vieira/Chiquinho, João Francisco Maia e Jorge Vieira. Seleccionador nacional: António Ribeiro dos Reis |
Regresso ao «Glorioso», regresso à Selecção Nacional
Só regressaria à selecção nacional na época de 1928/29 já
futebolista do Benfica, participando em dois jogos – com a França e com a
Itália. Atingiu as 12 internacionalizações, sendo em 1929 o 5.º futebolista
mais internacional.
Títulos nacionais e regionais
Na equipa
de 1.ª categoria conquistou quatro títulos oficiais: um Campeonato de Portugal
(designação inicial da Taça de Portugal) em 1929/30; e em 1919/20 um campeonato
regional de Lisboa e uma Taça de Honra da AFL. Nos 89 jogos, em que representou
o Benfica, ajudou o Clube a obter 52 (58 %) vitórias e 13 empates. Entre os
jogadores do Benfica, é o 19.º defesa direito mais utilizado e o 204.º jogador
com mais tempo de jogo!
Secretaria da Casa Pia de Lisboa
Após a carreira de jogador continuou empregado na
Secretaria da Casa Pia de Lisboa, vivendo em Belém. Já reformado, quando
enviuvou, decidiu ir morar com um filho em S. Mamede de Infesta, onde viria a
falecer aos 99 anos, em 22 de Março de 1998, completam-se, hoje, 22 anos. Dos componentes da primeira
selecção nacional (1921) foi o último sobrevivente. Em 13 de Março de 1996, com
97 anos, foi homenageado no anterior Estádio pelos futebolistas do Benfica,
quando ele era já o seu decano.
António
Pinho viveu sempre com orgulho – ser casapiano e benfiquista. Uma vida simples,
com dignidade. O Benfica jamais te esquecerá, eterno “ganso”.
Obrigado, Glorioso
Campeão
Alberto
Miguéns
NOTA: Muito obrigado ao casapiano Hélder Tavares que permitiu ilustrar melhor o texto acerca de António Pinho que ele conheceu e admira.
QUADRO RESUMO