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19 junho 2014

Os Percursos de Álvaro Gaspar

19 junho 2014 4 Comentários
GLÓRIAS DO GLORIOSO

AVISO: Texto longo acerca da história do "Glorioso" em 1912. Quem não gostar de história é melhor esperar por outro dia!




ÁLVARO JOSÉ GASPAR
Nascimento: 10 de Maio de 1889
Primeiro jogo: Desconhecido (por enquanto)
Primeiro jogo referenciado (3.ª categoria): 20 de Dezembro de 1908 (19 anos)
Primeiro jogo na 2.ª categoria: 24 de Outubro de 1909 (20 anos)
Estreia na 1.ª categoria: 25 de Setembro de 1910 (21 anos)
Último jogo na 1.ª categoria: 1 de Março de 1914 (24 anos)
Último jogo com o "Manto Sagrado": 11 de Abril de 1915 (25 anos)
Falecimento: 3 de Setembro de 1915 (26 anos)
Funeral: 5 de Setembro de 1915 (para o Cemitério da Ajuda)

Outono de 1912 (23 anos)


A ficha de Álvaro Gaspar
Com 23 anos, feitos em 10 de Maio de 1912, uma grande dedicação ao Clube, como mostram as respostas ao questionário da Ficha: Em que Clubs ou grupos? S.L.B & chega. Categoria Infantil 4:ª 3.ª 2.ª e 1.ª. Em que categoria entende dever jogar? A escolhida do capitão. Qual a posição que mais prefere? A que o capitão entender. Confessa pelo Club a sua dedicação e compromete-se a prestar-lhe o seu concurso incondicional? Até à morte. E foi! Três anos depois! Infortunado Chacha.



Em que época começou a jogar?
Pela Ficha de Inscrição que deve ter sido preenchida no início de 1912/13, quando Álvaro Gaspar tinha 23 anos, ele escreveu que jogava há sete anos sempre no SL Bemfica (ainda e até 1943 com mê) sem interrupções. Deve ter sido preenchida antes do início da época, pois segundo Rogério Jonet essa era a prática no Clube. Todos a preenchiam até o Capitão-Geral (treinador e organizador das equipas) Cosme Damião. Se jogava há sete anos e ininterruptamente, começou em 1905/06 ou 1906/07.

Vida de futebolista
Num tempo em que o futebol era amador os futebolistas praticamente não treinavam, a não ser nos domingos em que não havia jogos marcados. Nesses dias aproveitavam para assistir a jogos de outra categoria que não aquela para que estavam convocados e a seguir se o tempo o permitisse acabavam por aproveitar o campo para se exercitar com bola. A nível físico tinham por hábito aproveitar as deslocações entre casa e o local de trabalho para dar "uso às pernas" usando pouco os transportes a menos que as deslocações fossem longas ou estivesse mau tempo (chuva).


Onde vivia
Aquando do preenchimento da Ficha vivia na Graça, na porta n.º 16 do Bairro Estrela d' Ouro de Agapito Serra Fernandes, industrial de confeitaria de origem galega com padarias de confecção e lojas para venda. O bairro concluído em 1909 e que incluía a sua residência familiar estava destinado ao alojamento do pessoal empregado nos seus estabelecimentos. 

A porta da residência de Álvaro Gaspar aquando do preenchimento da Ficha de Jogador

Onde trabalhava
Álvaro Gaspar podia ser filho de empregados do industrial ou ser ele um dos empregados de Agapito Fernandes. Nesse tempo as pessoas tinham tendência a alugar a residência perto do local de trabalho evitando desperdício de tempo e custo em transportes. Mas nestas vilas operárias por vezes compensava a renda baixa (por ser empregado e esse factor entrar em conta na definição do salário) com a utilização de transportes, até porque no caso do Estrela d' Ouro, consta que o industrial tinha lojas em vários bairros da cidade.

O edifício onde o SLB instalou a primeira Sede no centro da cidade, em Agosto de 1912, no lado esquerdo do 2.º andar no n.º 30 da Praça D. Pedro IV/ Rossio (actualmente é o Hotel Metrópole) 

Onde convivia
Em 1912, a partir de 1 de Agosto, o Benfica passou a ter uma Sede na Baixa da cidade, muito por solicitação dos associados que eram cada vez em maior número e de vários bairros de Lisboa, não estando o Clube apenas circunscrito a Benfica e a Belém, onde continuava a ser muito popular. 

Em 24 de Agosto o clube publicou a seguinte notícia no jornal "Os Sports Ilustrados": «SPORT LISBOA E BEMFICA - Este clube abriu a sua nova sede (provisória) no Rossio, 30, 2.º esquerdo. O clube facilita por esta forma aos seus associados uma maior convivência e um centro de conversa, de que tanto careciam, a fim de se manterem firmes na sua divisa "Todos Por Um". As salas deste clube estão abertas aos sócios das 15 às 24 horas, nos dias úteis. A Direcção projecta a organização de palestras de instrução desportiva e boa e sã propaganda, onde os interessados acharão uma forma de aproveitar metodicamente as suas qualidades desportivas, pela teoria, a fim de que as possam executar na prática e com resultados bons. Os estatutos, que foram aprovados na última assembleia, vão começar a ser distribuídos por todos os sócios.»

É provável que Álvaro Gaspar tenha aproveitado a passagem da Sede de Benfica para o centro da cidade para utilizar com frequência as instalações do Clube no Rossio. Até porque não se sabendo onde trabalhava, sabe-se onde habitava. E do seu lar até ao Rossio não levava mais de 30 minutos, até menos, por ser a descer. Já no regresso custava mais subir os íngremes 200 metros entre a calçada da Mouraria e a calçada do Monte!

Percurso provável de Álvaro Gaspar sempre que se deslocasse do seu lar (C), para a Sede (S) no Rossio (Praça D. Pedro IV) ou desta para a Praça dos Restauradores, no início da carreira de carros eléctricos (E) rumo ao campo de Sete Rios

As carreiras de eléctricos com destino a Carnide ou Benfica passavam nos três campos de jogos que se instalaram - também por terem boa acessibilidade - na Estrada de Palhavã: P - campo de Palhavã (SC Império e depois Império LC); SR - campo de Sete Rios (SL BENFICA); e L - campo das Laranjeiras (CIF/ Internacional)
Onde treinava
Certamente no campo de Sete Rios, entre o que é hoje a Praça de Espanha e a Estação ferroviária de Sete Rios. E tinha três carros eléctricos - era assim que até há 40 anos, os lisboetas da geração de Álvaro Gaspar, designavam os eléctricos - que passavam junto ao campo: n.º 1 - Restauradores - Benfica, n.º 5 - Carmo - Benfica ou n.º 13 - Restauradores - Carnide.

O Benfica a defrontar os ingleses do Carcavellos Club, no campo de Palhavã, e o carro eléctrico (vê-se o tejadilho) a passar na Estrada de Palhavã

Em cima: O campo de Sete Rios onde o "Glorioso" jogou entre 1913 e 1917 numa marcação provável face às inúmeras (cerca de 30) fotografias que o trouxeram desses anos da década de 10 para o futuro. Em baixo: A urbanização, com casas e ruas, que ocupam na actualidade o mesmo espaço. Foi neste campo que Álvaro Gaspar viveu alguns dos momentos de maior alegria de uma vida breve...

Mudanças entre 1912 e 1915
Estamos no Outono de 1912. Em Setembro de 1915, aquando do seu falecimento vivia casado, com Laura d' Assunção Simões Gaspar, no rés-do-chão do n.º 24 na rua dos Jerónimos. Tinha estado empregado numa "Repartição" e trabalhava na 3.ª Secção da 3.ª Direcção das Obras Publicas. Onde quer que isso fosse... Talvez um dia saberemos! Até por onde ele andou!

Caminhos que provavelmente tantas vezes fez. Mas que terminariam em três anos...

Alberto Miguéns

NOTA FINAL: Por dificuldades técnicas - impossibilidade por excesso de informação - para que resulte com eficácia (publicar fotografias e documentos a ilustrar os textos) "A Vida Desportiva de Álvaro Gaspar Numa Dúzia de Datas (entretanto 15!)" está programada para os seguintes dias (coincidindo com efemérides relativas à relação de Álvaro Gaspar com o Clube):

PUBLICADO
1.       01.Mar.2014       O Último Jogo;
2.      05.Mar.2014      O Debutante;
3.      16.Mar.2014       O Crescimento;
4.      30.Mar.2014      A Resistência;
5.      09.Abr.2014       O Triunfo;
6.      10.Abr.2014       O Reservista;
7.      29.Abr.2014       A Titularidade;
8.      30.Abr.2014       A Internacionalização;
9.      06.Mai.2014       A Ficha;
10.    28.Mai.2014       O Brasil;
11.     19.Jun.2014       Percursos

A PUBLICAR
12.     02.Set.2014       A Derradeira Glória;
13.     03.Set.2014        A Última Época;
14.     04.Set.2014        O Funeral
15.     05.Set.2014        O Legado  

Aquando do 100.º aniversário do seu falecimento, em 3 de Setembro de 2015, conto fazer um "Especial" que junte os 15 textos e mais algum ou alguns se entretanto os tiver feito!  
4 comentários
  1. mais uma vez não tenho palavras, apenas um gesto de imensa admiração e agradecimento ao Alberto por estes pequenos monumentos escritos!
    são uma companhia EXTRAORDINÁRIA! Obrigado

    - Pedro Paiva

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  2. Que diferentes eram esses tempos.
    Sempre me pareceu que as deslocações deveriam ser um problema particularmente quando se deu a mudança de Belém para Benfica. Jogadores moradores na zona de Benfica deverão ter sido afectados.
    Cosme era pelo que sei apologista das virtudes do treino mas provavelmente nos primeiros anos terá sido complicado quer pelos conhecimentos e perspectivas primitivas sobre o treino quer como o Alberto coloca pelos aspectos práticos.
    cosme terá naturalmente feito uma evolução nos seus conhecimentos e nas virtudes do treino para o aprimoramento do jogo tanto do ponto de vista individual como colectivo. Agora, não havendo treinos nos dias de semana o problema das deslocações tornava-se menor.

    Percebe-se pelo que o Alberto mostra a importância da rede dos elétricos e o que terá representado na alteração de hábitos de mobilidade na cidade de Lisboa. Excelente esse detalhe do carro eléctrico a passar na fotografia do campo de Sete Rios.

    Curioso que Álvaro Gaspar tenha ido morar para a Rua dos Jerónimos. Provavelmente isso aconteceu depois de casar, talvez para a zona da sua esposa. Inteira especulação, claro.

    Por estas ligações:

    http://digitarq.dgarq.gov.pt/details?id=4235124

    http://www.aatt.org/site/index.php?op=Nucleo&id=1430

    se percebe que de 1859 até pelo menos a 1910 a 3ª Secção da Direcção das Obras Públicas e Minas tinha atribuições relativas aos monumentos históricos, edifícios públicos, obras de aformoseamento e recreio público. Não se percebe onde estava sediada mas talvez tivesse sido essa a repartição onde Gaspar trabalhou.

    Como sempre um excelente trabalho de investigação
    Muito obrigado
    VJ

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  3. Obg Alberto Miguéns por mais um trecho da nossa gloriosa história.

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  4. Errata em relação ao meu anterior comentário, onde se lê "Jogadores moradores na zona de Benfica deverão ter sido afectados" deve-se naturalmente ler "Jogadores moradores na zona de Belém deverão ter sido afectados". E neste caso presumo que Artur José Pereira, Henrique Costa, entre outros deverão ter apreciado pouco essa mudança. Não apenas por questão prática mas também pelo bairrismo de Belém e a perda de um clube representativo. A Álvaro Gaspar presumo não deverá ter feito grande diferença. Sabemos hoje que ele foi um dos atletas que acompanhou essa mudança. Note-se que foi Alberto Miguéns que revelou pela primeira vez que Álvaro Gaspar jogou desde sempre no Sport Lisboa (e Benfica). Essa ficha é uma peça maravilhosa de museu. Isto claro se o original sobreviveu aos descuidos do tempo.

    Um comentário final é para constatar que este período de seca de novas revelações sobre este jogador vai custar um pouco. Esperemos que o Alberto encontre tempo para outras magníficas peças da história Benfiquista. Não sei como consegue manter esta produtividade diária.

    Obrigado!
    VJ

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