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11 novembro 2016

O Treinador Pavic Para Além do Óbvio

11 novembro 2016 1 Comentários
MILORAD PAVIC NASCEU HÁ 95 ANOS, EM 11 DE NOVEMBRO DE 1921. PODE TER TREINADO APENAS UMA TEMPORADA, EM 1974/75, MAS REFERIR SÓ ISSO É MUITO REDUTOR PARA PERSONALIDADE TÃO MAGNÂNIMA.


No Futebol há a vertigem de quantificar para enaltecer ou denegrir, mas é uma forma simplista de classificar pessoas…

Chegou como segunda escolha
Foi campeão nacional recuperando o título - dando inicio a um Tricampeonato - e saiu, tendo dois anos de contrato, porque o Benfica temia não poder honrar os seus compromissos. Nada pediu em troca. Um gesto de gratidão que nunca poderá ser esquecido.


Plantel que pelo "caminho" de 1974/75 conquistou a Taça de Honra de Lisboa depois de V 5-1 ao CF "Os Belenenses" e V 1-0 ao Sporting CP. Da esquerda para a direita. De pé: Ibraim, Sheu, Messias, Jordão, Victor Batista, António Bastos Lopes, Toni, Nené e José Henrique; Em baixoDiamantino Costa, Moinhos, Barros, Eusébio, Simões (capitão), Artur, Bento e Humberto Coelho
Só foi treinador do “Glorioso” porque um seu conterrâneo «deu o dito por não dito»!
Após o abandono precoce – ainda no início da temporada de 1973/74 - de Jimmy Hagan o presidente Borges Coutinho, como era seu timbre, pensou e levou ao conhecimento dos dirigentes do Clube que havia que dar novo rumo ao Glorioso Futebol. A “Escola Jugoslava” era tida como a mais prometedora. Sabia dotar os futebolistas de força física sem lhes tolher a capacidade técnica e fazia evoluir o plantel com tácticas versáteis. O expoente máximo era o treinador do FK Estrela Vermelha e da selecção jugoslava: Miljan Miljanic. Borges Coutinho soube que o desejo de MM era deixar a Jugoslávia após a fase final do Mundial de 1974 (RFA/Alemanha Ocidental). E tentar fazer carreira no “Ocidente”. E atempadamente, em final de 1973, o treinador jugoslavo foi contactado e aceitou treinar o “Glorioso” após o Mundial, ou seja, em 1974/75. Os Benfiquistas viviam um sonho. Ter como técnico o “treinador da moda”!

Relatório e Contas. Parecer do Conselho Fiscal do Sport Lisboa e Benfica; 1973; Página 57

Quando chegou o Verão de 1974…
O Benfica percebeu que MM "roera a corda" mas manteve a escolha direccionada para a Jugoslávia optando por um treinador cerca de uma década mais velho mas com experiência no "Ocidente". Milorad Pavic que treinara, em Bilbau, o Athletic Club na temporada anterior (1973/74). 

Relatório e Contas. Parecer do Conselho Fiscal do Sport Lisboa e Benfica; 1974; Página 53

Trocou o Benfica pelo Real Madrid CF
Que bom proveito lhe tenha feito. Último jogo da Jugoslávia no Mundial em 3 de Julho. Chegada a Madrid dois dias depois. 


Pavic chega ao Benfica em "cima da hora"
Miljanic “deu o dito por não dito” e apesar de comprometido com o nosso clube, acabou no Real Madrid CF. Afastada a hipótese do “homem sem palavra”, o Benfica contratou um seu conterrâneo, Milorad Pavic. Curiosamente eram dois treinadores que se conheciam bem. Miljanic (nascido em 1930) foi aluno de Pavic (nascido em 1921) na Escola de Treinadores da Jugoslávia, já que durante quatro anos Pavic foi professor nessa afamada Escola. Miljanic além de futebolista treinado por Pavic foi ainda adjunto dele no FK Estrela Vermelha. Pavic depois de jogar no FK Estrela Vermelha treinou o popular clube de Belgrado entre 1957/58 e 1963/64. Miljanic continuou como adjunto (de Toplak) duas épocas tornando-se o técnico principal entre 1965/66 e 1973/74. O jugoslavo chegou ao “Glorioso”, aos 52 anos, sendo considerado um óptimo preparador físico e um técnico inovador e versátil. Dotado de forte personalidade, era culto e de trato afável, sendo ainda um excelente psicólogo e profundo conhecedor de “todos os segredos do Futebol”. Eis a famosa “Escola Jugoslava” dos anos 70!


Que "anjinhos". Depois do empate sem golos (com este onze inicial) em Eindhoven uma segunda mão desastrada, derrota por 1-2, na "Saudosa Catedral" atirou-nos para fora da Taça dos Vencedores das Taças, nos quartos-de-final, frente ao PSV. Da esquerda para a direita. De pé: Nené, Toni, Eusébio, Simões (capitão), Vítor Martins e Moinhos; Em baixo: Messias, Humberto Coelho, Barros, José Henrique e Artur
Quando duas foram uma
Contratado, por duas temporadas – 1974/75 e 1975/76 – em Bilbau, chegou ao Clube, em 19 de Julho de 1974, para preparar a nova temporada com o objectivo principal: recuperar o título perdido para o Sporting CP na temporada de 1973/74. E obteve o que se pretendia com distinção. A jornada decisiva – com direito a fotografia – foi no estádio do rival, a uma jornada do final da competição. Pelo “caminho” conquistou a Taça de Honra de Lisboa e foi finalista na Taça de Portugal. Na Taça dos Clubes Vencedores das Taças não houve argumentos para contrariar o poderio do futebol holandês.


Poucas alterações entre 1973/74 e 1974/75
O Benfica começou a sua 71.ª temporada com a habitual digressão de início de época. As pré-temporadas antes destas existirem “de facto”! Apenas uma contratação. Ibraim transferido do Vitória SC Guimarães. E uma semi-contratação. Vítor Móia que regressou depois do empréstimo ao COL/Oriental. Entre 31 de Julho e 5 de Setembro, o Benfica fez dez jogos antes do início do campeonato nacional (10 de Setembro). Quatro na digressão à América (México e EUA, com dois em cada um desses países) com regresso pela Bélgica (um jogo). Depois em Sevilha, no torneio de Verão local, dois jogos. Uma ida a Paris, defrontar a selecção francesa (D 2-4). E finalmente dois jogos, no Brasil, em Belo Horizonte. Resultados à Benfica. Três torneios, dois troféus: João Havelange nos EUA e “Internacional de Minas Gerais”. Em Sevilha um segundo lugar após derrota no desempate por pontapés da marca de grande penalidade. Números? Dez jogos, oito vitórias, um empate (Real Bétis de Sevilha) e uma derrota. Golos? 28 marcados e 17 sofridos.

Em 4 de Maio de 1975; 29.ª jornada; Empate a um golo; Equipa que iniciou o jogo. Barros e Victor Batista foram substituídos, respectivamente, por António Bastos Lopes e Sheu

Duas partes da temporada
A adaptação dos futebolistas à metodologia de Pavic não foi fácil. O Benfica na 15.ª jornada (final da primeira volta) estava classificado em 2.º lugar a três pontos do líder. Fez no entanto uma grande segunda volta conseguindo vencer o 22.º título a uma jornada do final, terminando a competição com cinco pontos de vantagem para o segundo classificado. Pavic foi ensaiando soluções – sempre de risco baixo – devido à qualidade do plantel para estabilizar num onze de grande qualidade. Na primeira volta sete pontos perdidos alguns com sabor a escândalo: na “Saudosa Catedral” foram quatro: dois empates - com SC Olhanense (2-2) e Sporting CP (1-1) – e uma derrota com o FC Porto (0-1). Em terreno alheio invencibilidade, mas três empates com Boavista FC (0-0), COL/Oriental (0-0) e União CI Tomar (0-0). Na segunda volta apenas insucessos em três jogos (quatro pontos “ao ar”) no terreno do adversário: Clube Académico de Coimbra (nome no pós-25 de Abril para distinguir a equipa profissional da equipa amadora da Associação Académica de Coimbra) com 0-0, Vitória FC Setúbal (D 1-2) e Sporting CP (E 1-1). E o FC Porto? Que ficou em 2.º lugar! O SLB foi vencer por 3-0, naquela que ainda é o último jogo ganho no terreno do FC Porto por três ou mais golos de diferença! Aliás 42 jogos depois temos apenas mais cinco vitórias: duas por um golo (3-2 e 1-0) e três por dois golos (2-0).

Relatório e Contas. Parecer do Conselho Fiscal do Sport Lisboa e Benfica; 1975; Página 67

Um adeus com sentido
Apesar de Pavic ter contrato por duas épocas, o certo é que o “Glorioso” (e todos os clubes portugueses) viviam tempos complicados, devido às condições políticas do País que mobilizavam os potenciais espectadores desportivos para manifestações e carácter político, social e sindical. Além disso o fim da “Lei de Opção” fez disparar os custos salariais com os futebolistas obrigando a encurtar os plantéis. As receitas eram escassas face aos elevados encargos, daí que o Benfica tenha proposto a rescisão do contrato ao treinador. À política de austeridade da Direcção, Pavic não colocou qualquer dificuldade, compreendendo a situação. Admirável atitude para com a instituição Benfica. Aliás o respeito era mútuo. 


Em discurso directo
Pavic afirmou, nas cabinas do Benfica, ainda durante a euforia da conquista do título, em 11 de Maio de 1975: «Estou grato pela colaboração e confiança que me deram. Estou satisfeito com esta experiência no Benfica e em Portugal, não posso continuar, por que tenho consciência dos graves problemas com que o Clube luta. Gostaria de poder continuar, mas noutras circunstâncias. É a vida…» O plantel treinado por Pavic, efectuou 58 jogos, com 38 vitórias, 14 empates e seis derrotas, marcando 132 golos e sofrendo 48! Puxa, Pavic!

Última jornada do campeonato nacional. Da esquerda para a direita. De cima para baixo: Fernando Cabrita (adjunto), Moinhos, Toni, Victor Batista, Fernando Neves (dirigente responsável pelo Futebol), Borges Coutinho (presidente da Direcção), PAVIC, Vieira da Fonseca (médico), Móia, Ibraim, Sheu, Jordão, Hamilton Marques (massagista), Eusébio e José Henrique; Messias, Palhinha (massagista), Barros, Simões (capitão), Humberto Coelho, António Bastos Lopes, Artur, Diamantino Costa, Bento e Nené  

As dificuldades financeiras do Benfica eram imprevisíveis
Depois de 25 de Abril de 1974 o Benfica perdeu muitos associados desinteressados do Clube e absortos pela política. As receitas de quotização e de bilheteira ressentiam-se. O presidente Borges Coutinho cauteloso conversou com o treinador acerca da incógnita para 1975/76. Continuaria o Clube a perder muitos associados e receitas? Após a «renumeração de 1973» o SLB tinha 41 985 associados. Um ano depois menos 987 (40 998 associados) e dois anos depois 34 605 (menos 6 393). Pavic percebeu as dificuldades e abdicou do segundo ano de contrato libertando o Clube desse compromisso. Um gesto de grande nobreza. Inesquecível.



Obrigado Pavic

Alberto Miguéns


NOTA: Faleceu aos 83 anos (16 de Agosto de 2005) na pequena cidade da Sérvia onde nasceu: Valjevo.

OUTRA NOTA: Como se sabe gosto de comparar a minha informação com a de outros. Vê-se com cada uma que parecem duas. Eis o Almanaque Tovar (Produto Oficial Benfica) na sua expressão mais doentia!


Almanaque do Benfica; Tovar, Rui Miguel; Lua de Papel; 3.ª edição; 2014; Lisboa

Então não!

1. Foi um passeio tão grande que após a 18.ª jornada o Benfica empatou em Coimbra (20.ª jornada; 0-0), marcou o golo da vitória em Guimarães aos 60 minutos (24.ª jornada; 1-0), marcou o golo da vitória aos 88 minutos, na "Saudosa Catedral", frente ao GD CUF (25.ª jornada; 1-0) e perdeu em Setúbal frente ao Vitória FC (1-2; 26.ª jornada);

2. Humberto Coelho estava clandestino em Paris pois "oficialmente" estava castigado. Deve ter vindo, por empréstimo, do PSG fazer ainda três jogos de final de época pelo "Glorioso";

3. Demissionário a cumprir contrato que até podia ter exigido ficar para 1975/76 ou ser indemnizado. Deve ter orientado (contrariado) o "Glorioso" nos três jogos de final de temporada. Frente à selecção de futebolistas africanos (D 1-2; Casablanca; Marrocos; último jogo de Eusébio; 18 de Junho); e os dois jogos para o Torneio Ibérico, em Badajoz (3.º lugar; 27 e 28 de Junho).






1 comentários
  1. Muito bom. Obrigado.

    Tinha ideia que Pavic é que tinha tido a iniciativa de sair pois estaria assustado com a agitação social estabelecida em Portugal. Nota-se pelo percurso que se adaptou ao SLB e com certeza teria continuado de forma ganhadora no SLB. Acabou por vir o velho Capitão. E ainda bem que veio.

    Ao que sei Pavic ainda treinou o SCP mas sem sucesso. Deve ter percebido bem a diferença da natureza e do potencial dos dois Clubes...

    Um agradecimento pelas alegrias que nos trouxe. Paz à sua Alma


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