MILORAD PAVIC NASCEU HÁ 95 ANOS, EM 11 DE NOVEMBRO
DE 1921. PODE TER TREINADO APENAS UMA TEMPORADA, EM 1974/75, MAS REFERIR SÓ
ISSO É MUITO REDUTOR PARA PERSONALIDADE TÃO MAGNÂNIMA.
No Futebol há a vertigem de quantificar para enaltecer ou
denegrir, mas é uma forma simplista de classificar pessoas…
Chegou como segunda escolha
Foi campeão nacional recuperando o título - dando inicio a um
Tricampeonato - e saiu, tendo dois anos de contrato, porque o Benfica temia não
poder honrar os seus compromissos. Nada pediu em troca. Um gesto de gratidão
que nunca poderá ser esquecido.
Só foi treinador do “Glorioso” porque um seu conterrâneo «deu o dito por
não dito»!
Após o abandono precoce – ainda no início da temporada de
1973/74 - de Jimmy Hagan o presidente Borges Coutinho, como era seu timbre,
pensou e levou ao conhecimento dos dirigentes do Clube que havia que dar novo
rumo ao Glorioso Futebol. A “Escola Jugoslava” era tida como a mais
prometedora. Sabia dotar os futebolistas de força física sem lhes tolher a
capacidade técnica e fazia evoluir o plantel com tácticas versáteis. O expoente
máximo era o treinador do FK Estrela Vermelha e da selecção jugoslava: Miljan Miljanic.
Borges Coutinho soube que o desejo de MM era deixar a Jugoslávia após a fase
final do Mundial de 1974 (RFA/Alemanha Ocidental). E tentar fazer carreira no “Ocidente”.
E atempadamente, em final de 1973, o treinador jugoslavo foi contactado e
aceitou treinar o “Glorioso” após o Mundial, ou seja, em 1974/75. Os
Benfiquistas viviam um sonho. Ter como técnico o “treinador da moda”!
Relatório e Contas. Parecer do Conselho Fiscal do Sport Lisboa e Benfica; 1973; Página 57 |
Quando chegou o Verão de 1974…
O Benfica percebeu que MM "roera a corda" mas manteve a escolha direccionada para a Jugoslávia optando por um treinador cerca de uma década mais velho mas com experiência no "Ocidente". Milorad Pavic que treinara, em Bilbau, o Athletic Club na temporada anterior (1973/74).
Relatório e Contas. Parecer do Conselho Fiscal do Sport Lisboa e Benfica; 1974; Página 53 |
Trocou o Benfica pelo Real Madrid CF
Que bom proveito lhe tenha feito. Último jogo da Jugoslávia no Mundial em 3 de Julho. Chegada a Madrid dois dias depois.
Pavic chega ao Benfica em "cima da hora"
Miljanic “deu o dito por não dito” e apesar de comprometido
com o nosso clube, acabou no Real Madrid CF. Afastada a hipótese do “homem sem
palavra”, o Benfica contratou um seu conterrâneo, Milorad Pavic. Curiosamente
eram dois treinadores que se conheciam bem. Miljanic (nascido em 1930) foi
aluno de Pavic (nascido em 1921) na Escola de Treinadores da Jugoslávia, já que
durante quatro anos Pavic foi professor nessa afamada Escola. Miljanic além de
futebolista treinado por Pavic foi ainda adjunto dele no FK Estrela Vermelha.
Pavic depois de jogar no FK Estrela Vermelha treinou o popular clube de
Belgrado entre 1957/58 e 1963/64. Miljanic continuou como adjunto (de Toplak)
duas épocas tornando-se o técnico principal entre 1965/66 e 1973/74. O jugoslavo
chegou ao “Glorioso”, aos 52 anos, sendo considerado um óptimo preparador
físico e um técnico inovador e versátil. Dotado de forte personalidade, era
culto e de trato afável, sendo ainda um excelente psicólogo e profundo
conhecedor de “todos os segredos do Futebol”. Eis a famosa “Escola Jugoslava”
dos anos 70!
Quando duas foram uma
Contratado, por duas temporadas – 1974/75 e 1975/76 – em Bilbau, chegou ao Clube, em 19 de Julho de 1974, para
preparar a nova temporada com o objectivo principal: recuperar o título perdido
para o Sporting CP na temporada de 1973/74. E obteve o que se pretendia com
distinção. A jornada decisiva – com direito a fotografia – foi no estádio do
rival, a uma jornada do final da competição. Pelo “caminho” conquistou a Taça
de Honra de Lisboa e foi finalista na Taça de Portugal. Na Taça dos Clubes
Vencedores das Taças não houve argumentos para contrariar o poderio do futebol
holandês.
Poucas alterações entre 1973/74 e 1974/75
O Benfica começou a sua 71.ª temporada com a habitual
digressão de início de época. As pré-temporadas antes destas existirem “de
facto”! Apenas uma contratação. Ibraim transferido do Vitória SC Guimarães. E
uma semi-contratação. Vítor Móia que regressou depois do empréstimo ao
COL/Oriental. Entre 31 de Julho e 5 de Setembro, o Benfica fez dez jogos antes
do início do campeonato nacional (10 de Setembro). Quatro na digressão à
América (México e EUA, com dois em cada um desses países) com regresso pela
Bélgica (um jogo). Depois em Sevilha, no torneio de Verão local, dois jogos.
Uma ida a Paris, defrontar a selecção francesa (D 2-4). E finalmente dois jogos,
no Brasil, em Belo Horizonte. Resultados à Benfica. Três torneios, dois
troféus: João Havelange nos EUA e “Internacional de Minas Gerais”. Em Sevilha
um segundo lugar após derrota no desempate por pontapés da marca de grande
penalidade. Números? Dez jogos, oito vitórias, um empate (Real Bétis de Sevilha) e uma
derrota. Golos? 28 marcados e 17 sofridos.
Em 4 de Maio de 1975; 29.ª jornada; Empate a um golo; Equipa que iniciou o jogo. Barros e Victor Batista foram substituídos, respectivamente, por António Bastos Lopes e Sheu
Duas partes da temporada
A adaptação dos futebolistas à metodologia de Pavic não foi
fácil. O Benfica na 15.ª jornada (final da primeira volta) estava classificado em 2.º lugar a três pontos do líder. Fez no entanto uma grande segunda volta
conseguindo vencer o 22.º título a uma jornada do final, terminando a
competição com cinco pontos de vantagem para o segundo classificado. Pavic foi
ensaiando soluções – sempre de risco baixo – devido à qualidade do plantel para
estabilizar num onze de grande qualidade. Na primeira volta sete pontos
perdidos alguns com sabor a escândalo: na “Saudosa Catedral” foram quatro: dois
empates - com SC Olhanense (2-2) e Sporting CP (1-1) – e uma derrota com o FC
Porto (0-1). Em terreno alheio invencibilidade, mas três empates com Boavista
FC (0-0), COL/Oriental (0-0) e União CI Tomar (0-0). Na segunda volta apenas insucessos
em três jogos (quatro pontos “ao ar”) no terreno do adversário: Clube Académico
de Coimbra (nome no pós-25 de Abril para distinguir a equipa profissional da equipa amadora da
Associação Académica de Coimbra) com 0-0, Vitória FC Setúbal (D 1-2) e Sporting
CP (E 1-1). E o FC Porto? Que ficou em 2.º lugar! O SLB foi vencer por 3-0,
naquela que ainda é o último jogo ganho no terreno do FC Porto por três ou mais
golos de diferença! Aliás 42 jogos depois temos apenas mais cinco vitórias: duas por um
golo (3-2 e 1-0) e três por dois golos (2-0).
Relatório e Contas. Parecer do Conselho Fiscal do Sport Lisboa e Benfica; 1975; Página 67 |
Um adeus com sentido
Apesar de Pavic ter contrato por duas épocas, o certo é que o
“Glorioso” (e todos os clubes portugueses) viviam tempos complicados, devido às
condições políticas do País que mobilizavam os potenciais espectadores
desportivos para manifestações e carácter político, social e sindical. Além
disso o fim da “Lei de Opção” fez disparar os custos salariais com os
futebolistas obrigando a encurtar os plantéis. As receitas eram escassas face
aos elevados encargos, daí que o Benfica tenha proposto a rescisão do contrato
ao treinador. À política de austeridade da Direcção, Pavic não colocou qualquer
dificuldade, compreendendo a situação. Admirável atitude para com a instituição
Benfica. Aliás o respeito era mútuo.
Em discurso directo
Pavic afirmou, nas cabinas do Benfica,
ainda durante a euforia da conquista do título, em 11 de Maio de 1975: «Estou grato pela colaboração e confiança que me
deram. Estou satisfeito com esta experiência no Benfica e em Portugal, não
posso continuar, por que tenho consciência dos graves problemas com que o Clube
luta. Gostaria de poder continuar, mas noutras circunstâncias. É a vida…» O plantel treinado por Pavic, efectuou 58 jogos,
com 38 vitórias, 14 empates e seis derrotas, marcando 132 golos e sofrendo 48!
Puxa, Pavic!
As dificuldades financeiras do Benfica eram imprevisíveis
Depois de 25 de Abril de 1974 o Benfica perdeu muitos
associados desinteressados do Clube e absortos pela política. As receitas de
quotização e de bilheteira ressentiam-se. O presidente Borges Coutinho
cauteloso conversou com o treinador acerca da incógnita para 1975/76. Continuaria
o Clube a perder muitos associados e receitas? Após a «renumeração de 1973» o SLB tinha 41 985 associados. Um ano depois menos 987 (40 998 associados) e dois anos depois 34 605 (menos 6 393).
Pavic percebeu as dificuldades e abdicou do segundo ano de contrato libertando
o Clube desse compromisso. Um gesto de grande nobreza. Inesquecível.
Obrigado Pavic
Alberto Miguéns
NOTA: Faleceu aos 83 anos (16 de Agosto de 2005) na pequena
cidade da Sérvia onde nasceu: Valjevo.
OUTRA NOTA: Como se sabe gosto de comparar a minha informação com a de outros. Vê-se com cada uma que parecem duas. Eis o Almanaque Tovar (Produto Oficial Benfica) na sua expressão mais doentia!
Então não!
1. Foi um passeio tão grande que após a 18.ª jornada o Benfica empatou em Coimbra (20.ª jornada; 0-0), marcou o golo da vitória em Guimarães aos 60 minutos (24.ª jornada; 1-0), marcou o golo da vitória aos 88 minutos, na "Saudosa Catedral", frente ao GD CUF (25.ª jornada; 1-0) e perdeu em Setúbal frente ao Vitória FC (1-2; 26.ª jornada);
2. Humberto Coelho estava clandestino em Paris pois "oficialmente" estava castigado. Deve ter vindo, por empréstimo, do PSG fazer ainda três jogos de final de época pelo "Glorioso";
3. Demissionário a cumprir contrato que até podia ter exigido ficar para 1975/76 ou ser indemnizado. Deve ter orientado (contrariado) o "Glorioso" nos três jogos de final de temporada. Frente à selecção de futebolistas africanos (D 1-2; Casablanca; Marrocos; último jogo de Eusébio; 18 de Junho); e os dois jogos para o Torneio Ibérico, em Badajoz (3.º lugar; 27 e 28 de Junho).
OUTRA NOTA: Como se sabe gosto de comparar a minha informação com a de outros. Vê-se com cada uma que parecem duas. Eis o Almanaque Tovar (Produto Oficial Benfica) na sua expressão mais doentia!
Almanaque do Benfica; Tovar, Rui Miguel; Lua de Papel; 3.ª edição; 2014; Lisboa |
Então não!
1. Foi um passeio tão grande que após a 18.ª jornada o Benfica empatou em Coimbra (20.ª jornada; 0-0), marcou o golo da vitória em Guimarães aos 60 minutos (24.ª jornada; 1-0), marcou o golo da vitória aos 88 minutos, na "Saudosa Catedral", frente ao GD CUF (25.ª jornada; 1-0) e perdeu em Setúbal frente ao Vitória FC (1-2; 26.ª jornada);
2. Humberto Coelho estava clandestino em Paris pois "oficialmente" estava castigado. Deve ter vindo, por empréstimo, do PSG fazer ainda três jogos de final de época pelo "Glorioso";
3. Demissionário a cumprir contrato que até podia ter exigido ficar para 1975/76 ou ser indemnizado. Deve ter orientado (contrariado) o "Glorioso" nos três jogos de final de temporada. Frente à selecção de futebolistas africanos (D 1-2; Casablanca; Marrocos; último jogo de Eusébio; 18 de Junho); e os dois jogos para o Torneio Ibérico, em Badajoz (3.º lugar; 27 e 28 de Junho).
Muito bom. Obrigado.
ResponderEliminarTinha ideia que Pavic é que tinha tido a iniciativa de sair pois estaria assustado com a agitação social estabelecida em Portugal. Nota-se pelo percurso que se adaptou ao SLB e com certeza teria continuado de forma ganhadora no SLB. Acabou por vir o velho Capitão. E ainda bem que veio.
Ao que sei Pavic ainda treinou o SCP mas sem sucesso. Deve ter percebido bem a diferença da natureza e do potencial dos dois Clubes...
Um agradecimento pelas alegrias que nos trouxe. Paz à sua Alma