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27 janeiro 2021

Mortimore no Quarto Anel

27 janeiro 2021 5 Comentários

FALECEU ONTEM, 26 DE JANEIRO DE 2021, O GLORIOSO TREINADOR JOHN MORTIMORE.



AOS 86 ANOS O TREINADOR INGLÊS FALECEU EM INGLATERRA.

John Mortimore fez muito face ao que se passava
Nascido em 23 de Setembro de 1934, chegou ao Benfica, para treinar, a mês-e-meio de completar 42 anos. Havia no Benfica, entre os responsáveis, a ideia que os futebolistas necessitavam de um treinador rigoroso, à semelhança de Jimmy Hagan. E assim foi. O presidente Borges Coutinho viu-o chegar mas, infelizmente, já não o viu regressar. John Mortimore já se tinha cruzado com o "Glorioso" como futebolista do Chelsea FC, em 7 de Outubro de 1964, numa Gloriosa Vitória, por 4-2, quando o clube londrino liderava o campeonato inglês.

O inolvidável campeonato de 1976/77 com o Benfica, à 12.ª jornada (em 2 de Janeiro de 1977) a seis pontos do Sporting CP, treinado por Jimmy Hagan, terminando com nove pontos de vantagem num campeonato com 30 jornadas!


John Mortimore merece que se destaque
Pelo que fez, em cinco épocas (3 + 2) permitindo ao Benfica conquistar dois campeonatos nacionais (1976/77 e 1986/87), duas Taças de Portugal consecutivas (1985/86 e 1986/87), ou seja com "dobradinha". Mais quatro Taças de Honra de Lisboa (1977/78, 1978/79, 1985/86 e 1986/87) além de torneios: Braga (1976/77) e Lisboa (1985/86 e 1986/87).

Da esquerda para a direita, em 1978/79: Mortimore, Pietra, Toni, João Santos (?) júnior, Pereirinha, Sheu, Alberto, Alhinho e Spencer  

No tempo do chumbo
Mortimore fez um trabalho em condições muito difíceis. Em ambas as passagens - meados dos anos 70 e meados da década seguinte de 80 - ante o poderio do FC Porto. O que fica para a Gloriosa História são os números mas para quem Benficava diariamente esses tempos nunca pode deixar de escrever acerca disso. Na primeira passagem "teve de levar" com a parelha José Maria Pedroto/Pinto da Costa, respectivamente treinador e chefe do Departamento de Futebol sob a presidência de Américo de Sá. Pinto da Costa com...39/41 anos! Não tinha 80 de idade como na actualidade. Na segunda passagem Pinto da Costa era presidente do FC Porto, com 47/49 anos com uma constelação de «malfeitores a trabalharem na sombra e às claras»: Lourenço Pinto e Valentim Loureiro, mais novos trinta e tal anos, mais os falecidos: Adriano Pinto, Luís César, Laureano Gonçalves, António Garrido, Hernâni Gonçalves e Pôncio Monteiro, entre muitos outros. Se o Benfica agora tem dificuldades perante estes velhotes ou desaparecidos imagine-se há 30 ou 40 anos. Mesmo assim o FC Porto conquistou nos últimos 16 anos, dez títulos de campeão nacional  (2 + 4 + 3 + 1) e o SLB os outros seis triunfos (1 + 1 + 4). Com velhotes e desaparecidos! Com eles em forma, e nós com a metodologia, esbanjamento e comportamento actual? Nem cheirávamos...embora nunca se consiga (felizmente...) provar. E os Benfiquistas já criticavam, nos anos 70, 80 e 90 a inacção ou falta de soluções dos seus dirigentes perante o portismo pintecostista. Mesmo assim era taco-a-taco até 1993/94. Nunca o FC Porto conseguiu, ser, sequer TRIcampeão!   


Mortimore. Ao fundo: Sheu

Primeira temporada
Em 1976/77 Benfica estava em transição. O fantástico núcleo dos Anos 60 terminara em 1974/75 com os abandonos de Eusébio, Simões, Jaime Graça, Adolfo, Humberto Coelho (para o PSG FC) e Artur Jorge. Em 1975/76 ainda ficara mais debilitado com a saída de Jordão para o Real Saragoça. O Clube deixara de ter ponta-de-lança apesar de transferir vários, mas com qualidade nunca revelada. Victor Batista mantinha-se no plantel mas era uma incógnita. Tanto podia fazer uma exibição de excelência como «não dar uma para a caixa»! Só com acesso a futebolistas com nacionalidade portuguesa e nascidos em território português o treinador teve que improvisar a linha avançada. Os Benfiquistas queriam um futebol à Jimmy Hagan, ou seja, com três avançados. Néné foi fixado (definitivamente) a ponta-de-lança (deslocado de extremo-direito) auxiliado por Nelinho e Chalana. No final da temporada de 1976/77 o Benfica depois de ficar a seis pontos da liderança à 5.ª jornada e ainda à 12.ª jornada estava a seis pontos,  consegue chegar ao final (30.ª jornada) com nove pontos de avanço para o segundo classificado treinado por...Jimmy Hagan.

O onze titular, em 8 de Maio de 1977, quando na «Saudosa Catedral» o Benfica sagra-se Campeão Nacional na 27.ª jornada (a três do final) após vitória por 4-0, frente ao SC Beira-Mar (onde jogava Eusébio) com golos de Néné (três primeiros) e Alhinho. O Benfica que pela 12.ª jornada estava a seis pontos do primeiro lugar conquistava o título a três jornadas do final da competição. Da esquerda para a direita. De cima para baixo: Bento, Eurico, António Bastos Lopes, Toni (cap.), Sheu e Pietra; Nelinho, Néné, Chalana, José Luís e Alhinho 

Segunda temporada
Com possibilidade do TETRAcampeonato o responsável (Romão Martins) pelo Glorioso Futebol encarregou-se de deixar enfraquecer o plantel permitindo a saída de Artur Correia para o Sporting CP, tal como pouco fez para que Jordão regressasse do Real Saragoça ao Benfica. Os titulares Moinhos e Nelinho deixam o Benfica. Regressa Humberto Coelho e o Benfica «foi-se com toda a força» ao mercado interno (como era habitual devido à limitação de contratar estrangeiros): Celso (avançado), Mário Wilson (filho do treinador Mário Wilson) e João Alves (antigo júnior). Também se aposta no promissor júnior Rui Lopes (avançado) e no guarda-redes Fidalgo. Muitos outros foram contratados mas nem interessa escrever acerca deles. Com a dupla Pedroto/Pinto da Costa cada vez mais activa e influente o Benfica tem de fazer um «campeonato cauteloso» jogando a tentar não sofrer golos. No final termina com os mesmos pontos do FC Porto (51) invicto cedendo nove empates para sete do FC Porto com uma derrota. Igualdade no confronto directo - dois empates - mas o FCP teve uma diferença de 60 golos (81/21) para 45 do Benfica (56/11). Onze golos sofridos em 30 jogos, mas o ataque...com Jordão outro galo cantaria!  

A equipa do "Glorioso" no encontro que mudou para sempre o futebol português. Em 28 de Maio de 1978, com o empate a um golo, o FC Porto, no estádio das Antas, na 28.ª jornada (em 30) quebra o jejum de 18 épocas consecutivas - 1959/60 a 1976/77 - sem conquistar o título de campeão nacional. Da esquerda para a direita. De cima para baixo: Eurico, Néné, António Bastos Lopes, Toni (cap.), José Luís e Fidalgo; Chalana, Pietra, Humberto Coelho, Alberto e Sheu. Fidalgo fez uma boa exibição mas Bento deixou-se ir na conversa do árbitro, na 26.ª jornada, em Setúbal, frente ao Vitória FC e foi expulso aos 82 minutos, com 1-0. Valeu a ida de António Bastos Lopes (que estava a jogar como defesa-direito) para a baliza - as duas substituições estavam efectuadas - para garantir os dois pontos. Estava "previsto" o FC Porto nem necessitar do jogo frente ao Benfica para se sagrar campeão nacional. Bento foi suspenso durante três jornadas - 27.ª, 28.ª (FC Porto) e 29.ª!

Terceira temporada
Em 1978/79, depois de duas boas temporadas o treinador continuou a ter a confiança do presidente Ferreira Queimado que sucedeu a Borges Coutinho (que o contratou). Mas o futebol português não era para brincadeiras. A principal aquisição foi o avançado Reinaldo além do júnior do Vitória FC (Setúbal) Diamantino Miranda que apenas foi utilizado num encontro para a Taça de Portugal, frente ao Aliados FC Lordelo. No final da época o "Glorioso" classificou-se em segundo lugar a um ponto do Bicampeão Nacional.  

Da esquerda para a direita, em 1978/79: Eurico, Humberto Coelho, Alberto, Pereirinha, Chalana, (?), Spencer, António Bastos Lopes, Mortimore e Sheu  

Segunda passagem
Coroada com duas Taças de Portugal consecutivas e uma "dobradinha" em 1986/87. Dois plantéis valorosos - 1985/86 e 1986/87 - que contra tudo e quase todos conseguiu proezas que à distância ainda se tornam mais espantosas.


1985/86. O treinador (John Mortimore), o capitão (Bento) e o que-foi-tudo-isso: Toni

Primeira temporada
Após um hiato de seis temporadas - 1979/80 a 1984/85 - e com um outro presidente (Fernando Martins) John Mortimore regressou ao "Glorioso" encontrando apenas seis futebolistas "conhecidos": Néné, Bento, Sheu, António Bastos Lopes, Pietra e José Luís. Também Diamantino Miranda era já um futebolista internacional e Carlos Manuel que John Mortimore tinha indicado, no final de 1978/79, para ser adquirido ao FC Barreirense mas que nunca treinara. O Benfica voltou a conquistar a Taça de Portugal (tal como em 1984/85 com Pal Csernai) e classificou-se em segundo lugar a dois pontos do FC Porto. E conquistou o troféu referente à Supertaça, o único frente ao FC Porto. Os restantes sete foram frente ao Sporting CP (1980/81 e 2019/20), CF "Os Belenenses" (1989/90), Vitória FC Setúbal (2005/06), Rio Ave FC (2014/15), SC Braga (2016/17) e Vitória SC Guimarães (2017/18).

1985/86. O onze titular, em 25 de Agosto de 1985, na estreia do campeonato nacional, primeira jornada, no estádio das Antas, frente ao FC Porto. Da esquerda para a direita. De cima para baixo: Bento (cap.), Sheu, Samuel, Nunes, Álvaro e Manniche; José Luís, Pietra, Oliveira, Diamantino (Miranda) e Carlos Manuel 

Segunda temporada
Desgastado com a época anterior - o FC Porto desgastava o Benfica com facilidade - apesar de uma temporada notável com a terceira Taça de Portugal consecutiva (segunda por John Mortimore) juntando-lhe o Campeonato Nacional, impedindo aquilo que parecia uma impossibilidade...o primeiro TRIcampeonato do FC Porto. Mas conseguiu. Depois foi o adeus justificando que preferia sair pois «nunca ficava onde não era bem-vindo». Para os adeptos (e dirigentes) o futebol deixara de cativar. Pudera. Com o FC Porto - Pinto da Costa tinha 49 anos - a manobrar por tudo quanto era sítio!

1986/87. Um onze titular que disputou três jornadas para o campeonato nacional, a primeira em 1 de Novembro de 1986, na "Saudosa Catedral", frente ao Rio Ave FC (9.ª jornada) com vitória por 3-1, golos de Dito, Chiquinho e Rui Águas. Da esquerda para a direita. De cima para baixo: Sheu (cap.), Chiquinho, Dito, Rui Águas, Álvaro e Silvino; Veloso, Oliveira, Wando, Diamantino (Miranda) e Carlos Manuel

O treinador inglês ficou aquém daquilo que merecia e valia
E não foi por "culpa" dele. Entre todos os treinadores estrangeiros que passaram pelo "Glorioso" até Sven-Goran Eriksson só falei com três, muitos anos depois de terem sido técnicos do Benfica. Jimmy Hagan (em Cascais, a meu pedido, com o fotógrafo Benfiquista Roland Oliveira como contacto), Fernando Riera (a dois anos de falecer) e John Mortimore há uma dúzia de anos. E foi um prazer dizer-lhes o quanto como Benfiquista lhes estava agradecido. Percebendo que nas suas duas passagens se aplicava na perfeição a ideia de Ortega y Gasset: «Um Homem é o homem e as suas circunstâncias».  

Obrigado, Mortimore


Alberto Miguéns

 

5 comentários
  1. Dizer que no campeonato que perdemos por um ponto, foi devido a um golo em fora de jogo do Duda, para ai uns 2 metros, no dia em que o Marco Aurelio partiu uma perna e chuva a potes.

    O campeonato de 1985/86 é o maior roubo a que assisti desde que comecei a ver o Benfica, esse campeonato foi puramente roubado ao Benfica, ainda hoje me recordo do jogo em Salgueiros 1-1 o golo do Salgueiros foi marcado pelo Armando voador, que estava a receber assistência médica junto à baliza do Benfica, a bola foi para lá e ele não fez por menos, entrou no campo meteu a bola na baliza e voltou a sair de campo, golo do Boavista limpo anulado nas Antas e que dava a vitória ao Boavista por 2-1, ficou 1-1, golo em Coimbra em mais um entre muitos penalties à Futre, 8 minutos depois da hora, penalty na Luz no jogo contra eles, não houve falta do Samuel e o dia em que o Bento disse ao árbitro é penalty? então vou defender e defendeu mesmo o penalty do Gomes.

    Mas mesmo assim o que deitou abaixo o Benfica nesse ano foi a eliminação em casa nos 1/4 de final da taça das taças perto do fim com o Dukla de Praga, em mais um jogo em que foi anulado um golo limpo ao Rui Águas que fazia o 3-0 e dava a passagem ao Benfica, a partir daí o Benfica caiu psicologicamente e a corrupção como o Alberto diz fez o resto, a década de 80 é a mais negra da história do futebol português e mesmo assim o Benfica ganhou 5 campeonatos, 5 taças e foi a 3 finais europeias, duas delas dos campeões europeus. Como diz o Alberto se o Benfica do Século XXi apanha-se o porto e os seus dirigentes da década de 80 nem fazia vaza.

    Para terminar fico satisfeito por não ser o único que acha que o Benfica até 93-94 foi sempre taco a ataco com eles, mesmo com tudo o que se passava nos bastidores, abraço

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  2. Pouco me lembro da sua primeira passagem pelo Benfica mas a excelente descrição do Alberto mostra como John Mortimore teve de arranjar soluções com planteis cada vez mais fracos. Foi lamentável que o Dr. Borges Coutinho não pudesse ter permanecido na presidência durante mais anos. Teria sido interessante para ele e para o Clube se tivesse tido os mesmos recursos humanos que teve Jimmy Hagan.

    Ao invés, lembro bem da sua segunda passagem pelo Benfica. John Mortimore nessa altura fez que as nossas equipas praticassem um futebol cauteloso, pouco ofensivo mas sempre com grande equilíbrio. Com raras excepções eram equipas competitivas mas sem grandes rasgos.

    Foi um dos grandes treinadores do nosso futebol. Um cavalheiro e um treinador competente. Deixou uma imagem simpática, competente e acima de tudo de alguém que percebia bem a grandeza do Clube, algo comum aos ingleses.

    Que descanse em Paz.

    Obrigado, John Mortimore.

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  3. Apenas uma correcção. Nas supertaças vencidas pelo SL Benfica , falta colocar a supertaça de 2019/2020 ( 5-0 ) vencida ao Sporting

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  4. Nunca me esquecerei do consulado de Damásio, a ser conciliador com esses tipos e enrolado a toda a linha, culminando com a contratação do Artur Jorge, cujas decisões originaram a travessia no deserto que se seguiu

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