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26 novembro 2016

Herói Derradeiro

26 novembro 2016 2 Comentários

FALECEU HÁ PRECISAMENTE 90 ANOS, COMPLETADOS HOJE, APÓS UMA LUTA “CORPO-A-CORPO” COM UM LEÃO, CARLOS SOBRAL CAPITÃO DE FUTEBOL DO “GLORIOSO” ENTRE FINAL DE 1915/16 E 1917/18.


Ainda não é hoje que terá o devido destaque um futebolista que foi um “caso à parte” no futebol português dos anos 10: jogava sem “amor à camisola” apenas pela paixão do jogo. Era-lhe indiferente o clube. Saiu do Benfica para fundar o CF “Os Belenenses”. Antes já tinha jogado no GS Cruz Quebrada, CIF/Internacional, Sporting CP e regressara ao CIF/Internacional. Será feita a devida evocação – em termos de “Gloriosa Biografia” - na data do seu nascimento: 8 de Fevereiro.


História do Sport Lisboa e Benfica 1904 - 1954; Volume I; Página 374; Mário de Oliveira e Rebelo da Silva; Lisboa; 1954; edição dos autores

Um final de vida que inspirou um dos mais notáveis romances portugueses do início dos anos 30
Coube a Joaquim Paço D’Arcos fazer dele um herói ficcionado no seu romance de estreia, em 1933, “Herói Derradeiro”. Escritor precoce de uma geração notável (Vitorino Nemésio, Adolfo Casais Monteiro, Miguel Torga ou Branquinho da Fonseca, por exemplo) ficou esquecido no meio intelectual português por ser considerado de “Direita” sabendo-se do anacronismo do século XX português: a Política era de Direita (Sidonismo e Estado Novo) mas a Cultura era de "Esquerda". Joaquim Paço D’Arcos não sendo neo-realista nem tendo simpatia pelo Reviralho foi ostracizado. Mas escreveu livros notáveis e o romance que faz de Carlos Sobral herói é, sem dúvida, superior ao que outros escritores da sua geração escreveram no início dos anos 30 e que na actualidade até são mais conhecidos. Embora por vezes só de nome, porque em Portugal ter cultura é considerado desperdício e supérfluo. Antes o pimba!



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Herói Derradeiro
Tem tudo este romance. Tudo o que um bom romance deve ter, funcionando como um microcosmos: uma escrita escorreita e poderosa (sem pieguices), um monumento à História portuguesa e um bom tema: amor; morte – e que morte - uma tragédia; sexo com as duas amantes do nosso Carlos Sobral, uma aristocrata britânica e uma preta filha de um régulo – que aliás dão o nome aos dois capítulos do livro (Helen Moore e Sinhara Carolina); traição e mistério (de uma mulher inglesa, pois claro!); corrupção na política portuguesa – os políticos corruptos para se distinguirem dos outros políticos também corruptos autointitulam-se “impolíticos”; a Imprensa ao serviço dos “impolíticos”; e o asco aos ingleses que – através da corrupção – conseguiam ter benefícios em Moçambique em detrimento dos portugueses. É este o “fio condutor” do romance. Carlos Sobral é o «Último Herói» porque não pactua com os ingleses (prescindindo de um cargo bem pago de director numa companhia inglesa), vai a Lisboa tentar obter igual tratamento mas querendo desviar a emigração para o Brasil (país estrangeiro) em direcção à África (portuguesa), percebe a corrupção que grassa entre os pequenos poderes para se mostrarem grandes e regressa a Moçambique para à força do seu trabalho e mão-de-obra local criar riqueza. Acaba morto por um leão que já tinha dizimado negros numa aldeia vizinha.


História do Sport Lisboa e Benfica 1904 - 1954; Volume I; Página 333; Mário de Oliveira e Rebelo da Silva; Lisboa; 1954; edição dos autores

História do Sport Lisboa e Benfica 1904 - 1954; Volume I; Página 333; Mário de Oliveira e Rebelo da Silva; Lisboa; 1954; edição dos autores

De Futebolista do Glorioso a Herói para um jovem escritor
Foi há 90 anos. Lutou a 20, expirou a 26 de Novembro. Faleceu, depois de uma agonia de sete dias devido a feridas infectadas e carne esfacelada por um leão, aquele que pode ser considerado o sétimo capitão da Gloriosa História, depois de António Couto, Silvestre Silva, Fortunato Levy (há um Levy no livro que é, certamente, inspirado no pai do nosso Levy, pois também ia para o Brasil e a avaria no navio fez com que fizesse vida em São Vicente/Cabo Verde), Félix Bermudes, Cosme Damião e Henrique Costa. Além disso Cosme Damião “foi buscá-lo” ao CIF/Internacional para o substituir – como médio-centro e capitão - pois estava decidido a abandonar o Futebol em 1916! E o futebolista que ele pensava ser o seu sucessor tinha “fugido”, no final da época de 1913/14, para o Sporting CP: Artur José Pereira.


História do Sport Lisboa e Benfica 1904 - 1954; Volume I; Página 328; Mário de Oliveira e Rebelo da Silva; Lisboa; 1954; edição dos autores

Quatro épocas, um TRIcampeonato Regional
Jogou com o “Manto Sagrado” entre o final de 1914/15 (dois jogos particulares para “testá-lo”) e 1918/19. Com cifras importantes (para além de exímio nadador, poloaquatista e saltador para a água):
5 465 minutos
61 jogos
5 golos
30 jogos a capitão, entre 1915/16 (final da época) e 1917/18
Três campeonatos Regionais (1915/16, 1916/17 e 1917/18) os dois últimos como capitão.

Resta homenageá-lo neste blogue com a frase que gostava de citar entre conversas com amigos e "amigas": «Eu sou aquele que poderia ter sido e o meu nome é Nunca Mais».

Um Glorioso Capitão

Alberto Miguéns

NOTA: O autor indica, no posfácio, de onde retirou as personagens históricas para a ficção no livro


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2 comentários
  1. Carlos Burnay da Cruz Sobral. Herói trágico, herói derradeiro. Campeão de natação, campeão no futebol. Foi um "globetrotter" mesmo à escala da época. Este evocação que o Alberto faz é muito justa. Chegou já um pouco tarde ao nosso Clube mas ainda assim foi tricampeão, ocupando o lugar que antes tinha sido de Cosme.

    Carlos Sobral terá mostrado o seu talento com a nossa camisola. Devemos assim lembra-lo mesmo que no final estivesse envolvido na turbulenta saída de diversos jogadores para fundar o CF "os Belenenses". Foi um rude golpe no nosso Clube embora não tão grande como o que viria depois com a cisão liderada por Cândido de Oliveira.

    Findo o futebol veio a aventura Africana. Se não fosse Joaquim Paço D'Arcos com certeza que saberíamos muito menos da sua vida em África. Mesmo que romanceada, a escrita de Joaquim Paço D'Arcos descreve uma sua vida aventurosa, fruto do local e da personalidade de Sobral. O homem no seu elemento.

    O fim foi trágico. As linhas do Joaquim Paço D'Arcos são impressionantes de realismo e tragédia. Morte na flor da vida, num leito e em agonia de um campeão que mostrou a sua exuberância atlética nas águas e nos campos. Trágico.

    O seu texto é excelente, Alberto. Obrigado!

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  2. Relembrar os nossos heróis de antanho é preciso!!!

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